O discurso do "sou deste clube desde pequenino" ou "estou no clube do meu coração" enche de alegria a quase totalidade dos adeptos de futebol. Parece por momentos que uma pessoa que está num lugar (para o comum adepto) de sonho se identifica verdadeiramente com aquilo que defendemos.
Eu não sou de ir nessa cantiga por dá cá aquela palha, mas há alguns que ainda me enganam; certamente que as juras de amor eterno de um Fábio Coentrão não me convencem, mas quando ouvi o antigo treinador (e guru) do FCP dizer continuadamente e com tanta convicção que não saía, quando ouvi o presidente dos azuis afirmar com toda a certeza que o técnico não sairia, e com os relatos de portismo que se iam sabendo de Villas Boas, estava sinceramente convencido que neste caso seria diferente.
Lembro-me de pensar que se estivesse no meu lugar de sonho, sentado numa cadeira parecida mas em tons de vermelho, teria o mesmo discurso. Lembro-me de pensar que afinal havia alguém no futebol que partilhava com os adeptos o amor genuíno por um clube. Estava enganado.
Com isto não faço uma crítica a Villas Boas mas sim uma auto-crítica. Tenho já idade suficiente e experiência como adepto para perceber que há valores mais altos que os do fanatismo. André Villas Boas foi profissional e escolheu com a razão, foi ganhar mais, com melhores condições de trabalho e para uma Liga incomparávelmente superior. A visibilidade e o reconhecimento que pode vir a alcançar são infinitamente superiores.
Mas sinceramente, não havia necessidade. Não havia necessidade de fazer aquele discurso para meses depois fazer isto. Teria sido perfeito manter um discurso coerente nesta matéria como foi em todas as outras, sempre foi equilibrado apesar de ambicioso, sempre foi justo nas avaliações apesar de por vezes agressivo, por que razão disse que não faria o que acabou por fazer?
Não sei, sei apenas que como adepto é mais uma demonstração que como nós ninguém sofre. Podem sofrer dentro de campo ou no banco à sua maneira, mas não é à maneira do adepto que ganhe ou perca no dia a seguir ergue a cabeça e (re)assume o seu clubismo.
Sobre a forma escolhida por Villas Boas para sair, nem uma crítica. O ex-pupilo de Mourinho terá aprendido alguma coisa com o Special One e evitou males maiores para si e para a sua família ao contratar uma empresa de segurança e ao comunicar ao FCP a rescisão por Fax. Lá terá tido as suas razões. Melhor do que ninguém conhece a peculiar dinâmica daquele clube e da relação entre direcção e principal claque. E de qualquer forma foi o próprio presidente que disse que não negociava com ninguém, era bater a cláusula e levar, foi o que aconteceu...